Aracaju e o nível do mar

         
     

Por Osvaldo Vieira de Matos

 
         

 

01/junho/2016

         
 

 

Este assunto raramente é comentado, mas quando isto acontece é bastante divergente. Afinal a nossa cidade fica acima, no mesmo ou abaixo do nível do mar? Nas minhas  décadas de existência nunca conheci alguém aqui que considerasse Aracaju acima deste nível e sim abaixo. E você aracajuano que está começando a ler esta matéria, o que acha? Recentemente ouvi um senhor de 60 anos, alguém bastante experiente, afirmar categoricamente que estamos a 200 metros abaixo. (Vige Maria). As pessoas alegam que nas suas aulas de geografia no passado sempre aprenderam dessa forma. Parece que para algumas pessoas é mais fácil entender o que seja fissão/usina nuclear e bomba atômica  do que o que caracteriza o nível do mar.

 

Para que haja qualquer comentário sobre este assunto é necessário que se fale aqui, embora num caráter amadorístico, o que caracteriza realmente o nível do mar. Em primeiro lugar, nos estudos oceanográficos o termo real utilizado é “Nível Médio do Mar – NVM”, pois o que existe ao longo do dia é uma altitude média da superfície dos oceanos e não um valor fixo, inalterável.

 

O NVM possui várias utilidades úteis no nosso “dia a dia”, como a determinação das altitudes dos acidentes topográficos, das curvas de nível e suas cotas nos mapas e plantas cartográficas, na altitude de uma aeronave, na hidrografia costeira para medição das profundidades dos portos, pontes e várias outras aplicações. Uma medição precisa do nível do mar em qualquer região costeira do nosso planeta é extremamente difícil de ser obtida, mesmo se utilizando equipamentos digitais modernos denominados “marégrafos”. A variação diária desse nível também difere de um determinado local para outro, pois estamos no meio de um sistema solar que se altera constantemente, como as marés provocadas pela lua, ondas grandes e pequenas provocadas pelo vento, zonas de alta e baixa pressão atmosférica que também modificam o nível da superfície dos oceanos, alterações de temperaturas nos mares que modificam a densidade e o volume da água, volume de chuvas e água dos rios fluindo para os oceanos.

 

Bem, mas vamos voltar ao título deste nosso comentário. Afinal onde estamos situados com relação ao nível do mar? Ah, ia esquecendo um “pequeno, um pequenino” detalhe. Os homens criam leis visando estabelecer normas e regras para a conduta social. Quem infringir essas leis poderá ser multado, processado, preso... Que  digam os promotores, juízes e advogados. Mas existe uma lei universal em todos os planetas do universo, que é a LEI DA GRAVIDADE, sim, a LEI DA GRAVIDADE. Esta lei é o tópico principal deste nosso comentário. Quem infringir a mesma não irá procurar um advogado e sim um ortopedista, um pronto socorro, um hospital e dependendo da gravidade do caso lhe será prestado uma última homenagem no OSAF.

 

E como entender a “relação íntima” entre o nível do mar e a lei da gravidade? Bem, vamos supor que você vai assistir um grupo de pagodeiros lá na área do mercado, por exemplo. (Gosta de pagode?). Esses excelentes músicos estão localizados num palanque, a um ou dois metros de altura. Você está a alguns metros em frente deles, curtindo a beleza das músicas (cuidado com sua carteira, com seu celular).  Para você apreciá-los claro que tem que olhar para cima não é? Agora o oposto. Os seus queridos músicos estão lá em cima olhando para você. Lógico que eles olham para baixo. Aí termina o show e um engraçadinho coloca lá em cima um tonel de 200 litros cheio de água e vira o mesmo. O que acontece aí com o líquido? Que pergunta boba não é? É claro que a água desce, vem para o chão. E por que desce? Ora, por causa da lei da gravidade, por que a água estava num nível acima do solo que você estava pisando.

 

Gosta de praia? Então vá  curtir a nossa atalaia numa manhã de domingo. Sentado numa mesa de um bar (beba com moderação) você fica apreciando o oceano, as suas ondas. Bem, e o oceano  está situado acima ou abaixo de você? Pergunta idiota não é? Claro que as ondas estão abaixo de você, mesmo com a maré alta, no mês de março. Aí  neste exato momento você está é contemplando o nível do mar, ou seja, ele está abaixo do local em que você está pisando. A mesmíssima coisa pode-se observar na Ponte do Imperador, na orlinha do bairro Industrial e outros locais.

 

Constata-se aí de forma bastante clara que nossa cidade localiza-se  acima  do nível do mar e essa situação ocorre não só aqui  como em todas as capitais litorâneas banhadas pelos oceanos. Claro que exclui-se aí os chamados Países Baixos da Europa, mas isso é outra história.

 

Agora uma análise um pouco mais complexa. É uma bobagem muito grande se quantificar dizendo que estamos a “tantos metros acima” do nível do mar. Tal afirmação só faria sentido se nossa capital fosse totalmente plana como uma tábua, ou se fosse estabelecido um ponto referencial, uma espécie de “marco zero geográfico”. Os diversos bairros existentes em nossa cidade apresentam condições topográficas bastantes diferentes. Uns mais altos e outros mais baixos. (Bem, isso ocorre no mundo inteiro). Aí alguém pode falar uma bobagem dizendo que tal área em determinado bairro fica abaixo desse nível. Ora, se um local qualquer situado em um bairro de uma cidade ficasse abaixo do nível do mar, quando chovesse, principalmente no inverso, as águas ficariam presas, retidas, as ruas se tornariam verdadeiros lagos permanentes e aí somente no verão com o calor do sol e com a evaporação da água é que se voltaria ao normal. Já pensou você morar num local assim? Valha-me Deus, que castigo.

 

Bem, mas alguém pode indagar “E algumas ruas do Treze de Julho?” Aí a situação é bastante típica, complexa. Um dia desses passei  na Praça da Imprensa e lá tava tudo inundado com água de esgoto proveniente do canal de escoamento que  desemboca no Rio Sergipe. Vamos juntos tentar entender este fenômeno. O que acontece por lá é que o canal de escoamento de dejetos líquidos provenientes de diversas ruas de vários bairros que desemboca no rio, possui desde o  início até o seu final, vários quilômetros de extensão. Lá no início do princípio do seu começo (ôpa, pleonasmo?) ele foi escavado em um determinado nível.

 

Durante o seu percurso este nível foi sendo rebaixado para o escoamento das águas poluídas, pois de outra forma os dejetos ficariam estagnados, nem prá frente nem prá trás. No final desse escoamento no Treze de Julho, ele termina com um nível igual à maré alta em determinados meses do ano. Quando nesse período a maré sobe aí existe um “confronto”. Quem vence é o mais forte,  claro que a maré. Então os dejetos, coitados, são empurrados prá trás, começam a subir e inundar as ruas próximas ao canal. Eu não sei como vai ser daqui a uns 20 anos. A coisa vai ficar “preta”.

 

Mas no cômputo geral o bairro 13 de Julho localiza-se acima do nível do mar. Já tá bom este assunto não é? Já enchi bastante  o “saco” não foi? Então até o próximo.

 

 

 

Osvaldo Vieira de Matos

Natural de Aracaju/SE, casado, Professor aposentado da Escola Técnica Federal de Sergipe (hoje IFS), onde lecionou as cadeiras de Projetos de Redes Elétricas, Desenho Técnico e Transformadores. Integrou o corpo técnico da então Empresa Distribuidora de Energia em Sergipe S/A – ENERGIPE, como eletromecânico. Atuou como Coordenador do Núcleo de Eletrificação Rural daquela empresa, durante 17 anos. Como representante da então ENERGIPE participou de simpósios sobre eletrificação rural nas cidades de Acapulco no México e Lima no Peru. Atualmente, há vários anos que se dedica como voluntário na SOFISE – Sociedade Filarmônica de Sergipe, na correção de textos de trabalhos publicados, edição de vídeos e no programa radiofônico Sementes Musicais.